Ganhar a vida no Cais do Porto Novo: missão impossível
As vendedeiras que labutam no cais da cidade de Porto Novo passam por dias difíceis. As vendedeiras de queijo, frutas, doces e licores passam o dia debaixo do sol no cais, mas vendem pouco ou nada.
Para estas chefes de famílias tem sido penoso amealhar dinheiro para levar para casa e sustentar os filhos. Porque a maior parte destas vendedeiras ambulantes vêm de localidades distantes da cidade do Porto Novo. Elas saem de casa de manhãzinha e só regressam a noite com 500, 1000 ou… 2000 escudos fruto de um dia de trabalho.
Queijeiras
Maria do Carmo tem 38 anos mora na zona de Corda e é mãe de seis filhos. A família de Maria vive da venda de queijos fabricados pela Maria e os filhos na residência da mesma. Maria do Carmo frisa que “o sustento da minha família provém da venda de queijo, pois moro na antiga estrada e ali colocava o balaio de queijo a porta. Todo o pessoal que fazia viagem entre Santo Antão e São Vicente tinha o hábito de fazer uma pausa em Corda e numa fracção de minutos vendia cerca de 200 queijos”.
Hoje a história muda de figura e Maria tem que sair de casa as seis e meia com o seu balaio de queijo para deslocar ao cais do Porto Novo. Maria esclarece que “a estrada Porto Novo/Janela prejudicou a minha vida. Porque agora quase ninguém passa em minha casa para comprar queijo. A solução foi vir vender no cais e nem todos compram o queijo pois acham que por 170 escudos está caro. Sem falar na concorrência das outras vendedeiras e os fregueses que duvidam da qualidade do queijo”.
Doces e frutas
Por outro lado as vendedeiras de doces e frutas sentem na pele o verdadeiro sabor da crise. Pois percorrem grandes distâncias para colher as frutas ou ficam horas ao fogão produzindo doces. Porém quando chegam com os produtos no cais do Porto Novo a resposta dos fregueses é quase a mesma: neste momento não, ou senão carteira está vazia.
Belinda e Florinda Lopes são duas irmãs portonovenses que escolheram o cais da cidade do Porto Novo como segunda casa. Belinda possui três filhas, enquanto sua irmã Florinda é mãe de quatro filhos. As duas irmãs residem em Ribeira da Patas na companhia dos pais que possuem alguns pedaços de terras.
Segundo as duas irmãs “todos os dias levantamo-nos às três da manhã á procura de produtos na horta dos nossos pais. Toda as mangas e maças recolhidas são embaladas para serem comercializadas no cais. Já os doces são confeccionados com papaia ou goiaba e enchidos em frascos”. Mas os efeitos da crise fazem-se sentir nos bolsos destas duas irmãs.
Florinda e Belinda afirmam que “o movimento de dinheiro no cais está fraco, porque agora o que ganhamos num dia nem chega aos dois mil escudos. Ou seja já ninguém quer comprar frutas ou doces na porta do cais. Pois dizem que os produtos estão caros, ou inventam desculpas que irão comprar numa próxima viagem, bem como afirmam que se comprarem frutas ou doces irão sentir a falta desse dinheiro no outro dia. Neste sentido o resto dos produtos que fica é levado para casa e se houver frutas estragadas vão para os porcos”.
Só experimentar
Já Luciana Monteiro sobrevive da venda de licores produzidos pelos pais em Ribeira da Cruz. A jovem de 20 anos ruma todos os dias de manhãzinha ao cais da cidade do Porto Novo. A jovem perdeu a idade escolar e a solução foi substituir a mãe que hoje cuida dos sete irmãos.
Luciana explica ao NN o seu dia-a-dia em busca de dinheiro que parece não querer entrar nos bolsos das vendedeiras ambulantes que circulam pelo cais do Porto Novo. Monteiro frisa que “por dia trago cerca de dez litros de licores par vender as pessoas que viajam para São Vicente. Noutro cesto trago as essências paras os fregueses provarem a qualidade do produto. Mas só que nos últimos meses o negócio tem fracassado, pois há fregueses que só querem experimentar e de seguida dizem que não tem dinheiro para comprar licores. Vendo cada litro por 400 escudos e se quiser vender uma ou duas garrafas tenho que andar neste sol quente atrás das pessoas pedindo para ajudar no sustento da minha família”.
O rosto destas mulheres demonstram o sofrimento que elas passam debaixo do sol da cidade do Porto Novo para conseguir algum dinheiro que chegue para sustentar a família. Pois a noite quando o último navio abandona o cais, elas recolhem para as suas casas com a sensação de que o amanhã será melhor que o dia de hoje. Mas não tem sido.